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A quem pertence a Semana da Pátria?

O primeiro 07 de setembro pós-governo Bolsonaro é um teste de estresse para o país e suas instituições

Creomar de Souza, para Headline Ideias
#POLÍTICA1 de set. de 235 min de leitura
Militar participa dos desfile de 7 de setembro de 2018, em Brasília. Fotos: Daniel Marenco/HDLN
Creomar de Souza, para Headline Ideias1 de set. de 235 min de leitura

O dia 07 de setembro de 2023 será histórico. Não importando de fato o que aconteça no próximo feriado de independência, sua mera realização é um marcador síntese dos componentes que constroem a crise política em que este país está encarcerado desde o ano de 2013. Afinal, passada uma década desde a eclosão das manifestações contra os reajustes dos preços do transporte público país adentro, os problemas crônicos do país seguem vivos durante esta década perdida.

Em primeiro plano, é possível observar que a descrença dos cidadãos na capacidade das instituições e dos atores políticos em resolver problemas coletivos segue solapada. Da baixa confiança no legislativo, historicamente persistente, ao seu contágio para outros organizações estatais, tais como, as forças armadas, o que se percebe é que se a antipolítica nasceu sob os auspícios de uma nova forma de realizar a coisa pública, seu dia seguinte se manifesta como uma espécie de marcha fúnebre que afeta profundamente os marcadores do que seria um espírito coletivo nacional.

A partir desta figura inicial, um tanto quanto cética acerca dos caminhos do país, surge como pano de fundo a necessidade de compreender quão impactantes serão no médio e longo prazos os efeitos de uma influência da extrema direita na construção das regras do jogo democrático. O fato é que apesar de um esforço institucional, liderado pelo poder judiciário, em conter os excessos e crimes perpetrados em passado recente, o impacto do discurso de negação do estado de direito se consolidou em largas camadas da sociedade.

O efeito disto em termos de percepção da realidade é que, muito do que envolve as investigações contra excessos e mau uso dos recursos públicos sejam interpretados ao final do dia como mera vingança e justiça. Esta incapacidade, de discernir entre o justo e o excessivo, o certo e o errado e o lícito e o ilícito, tem sido alimentada no tempo pelos próprios representantes institucionais, sendo eles eleitos ou não. Ao final, o que se sobressai é a capacidade de distorcer regras do jogo de acordo com seus interesses e conveniências.

Tendo o adágio popular “o exemplo vem de cima” como referência, é possível compreender que se aqueles que estão todos os dias trabalhando de maneira árdua para sobreviverem não encontram respaldo nos exemplos das autoridades, o caminho mais pragmático é o da busca de outros ares e a desconsideração das regras de vida coletiva como sendo válidas. Este movimento, que alimenta tanto condutas extremistas do ponto de vista político, quanto condutas ilícitas do ponto de vista criminal, são um desafio de difícil superação para todos aqueles que depositam sua fé na consolidação de uma sociedade plural, livre e justa.

Neste aspecto em específico, a reflexão sobre a semana da Pátria e seus impactos no prédio político nacional assumem importância estratégica. Afinal, mais do que quaisquer outras datas comemorativas, o dia 07 de setembro foi objeto constante de captura por grupos políticos de extrema direita. Se a tensão explícita que marcou à véspera desta data nos anos anteriores é minorada na atual conjuntura, não deixa de ser explícita a necessidade de atenção das autoridades aos riscos derivados de eventuais ações extremistas, tais como vistas no período entre o anúncio dos resultados eleitorais de 2022 e o dia 8 de janeiro de 2023.

Pessoas assistem os desfile de 7 de setembro de 2018, em Brasília. Foto: Daniel Marenco/HDLN
Pessoas assistem os desfile de 7 de setembro de 2018, em Brasília.

O ponto, portanto, é que apesar do recuo temporário ou talvez estratégico daqueles que insuflaram populares a se insurgirem contra o prédio democrático, de fato o país segue tanto quanto ferido e dividido. Neste cenário, a única resposta possível para a superação deste dilema seria a assunção pelas lideranças políticas e institucionais do enorme impacto que suas decisões possuem sobre as percepções de realidade.

Ao se guiarem, portanto, apenas pelas suas próprias agendas, se constituem em uma variável de risco político para o próprio espaço que eles construíram e mantem. Tal dilema, que não acomete isoladamente o Brasil, é algo que tem sido explorado com frequência por grupos políticos de extrema direita em variadas democracias ao redor do planeta, com efeitos que são prejudiciais ao avanço das instituições e o aprimoramento de mecanismos de inclusão democrática.

O 07 de setembro de 2023, portanto, nasce sob as expectativas de ser um recomeço para uma jovem democracia com enormes desafios. Corre o risco de ser mais uma vez capturado pelo tumulto, a violência e a ameaça, em uma espécie de construção distópica da realidade, onde a própria percepção do que venha a ser um brasileiro seja posta dentro de uma determinada caixa ou na alegoria de que há um nós contra eles. A torcida, portanto, é a de que ao final da semana pátria, possam ser dados os primeiros passos para superação da crise política que nos vitima desde meados de 2013.

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